“CRIME NA
CATEDRAL”
UM ESPETÁCULO
DE GALA NO AUDITÓRIO DO IEMG
Introdução
Com a desativação do Teatro Municipal de Belo Horizonte[1],
em 1939, na administração do prefeito Juscelino Kubitschek, a capital mineira
ficou sem um local adequado para a apresentação de peças teatrais, concertos e
shows musicais. O novo teatro municipal deveria ser construído dentro do Parque
Municipal. Contudo, esse projeto só ficou pronto muito tempo depois, no ano de
1971, com a inauguração do Palácio da Artes.
Visando suprir a falta de casas de teatro na capital, em 1949, foi
construído, também no Parque Municipal, o Teatro de Emergência (que mais tarde,
recebeu o seu nome definitivo “Teatro Francisco Nunes", em homenagem ao grande músico
mineiro). Mas, esta medida não foi suficiente. Era
necessário encontrar locais próprios para a realização das produções teatrais e
apresentações musicais. Foi neste contexto que o auditório do Instituto de
Educação de Minas Gerais se tornou para a classe teatral da nossa cidade um
local de grande importância.
O auditório do IEMG tem capacidade para mais
de quinhentas pessoas. Tem um palco italiano, ou seja, um palco retangular onde os espectadores ficam apenas de frente. Com o formato de caixa aberta na parte defronte ao público e em
plano acima da plateia, o palco é delimitado pela boca de
cena (proscênio) e cortina. Além de possuir caixa cênica com urdimento, coxias
e varandas. Oferece boas condições de visibilidade e acústica e possibilita uma
grande variedade de transformações cênicas exigidas pela ação. A distribuição
do público permite que os espectadores tenham comodidade e uma ampla visão em
qualquer ponto da casa. Os lugares se dividem em plateia e balcão.
A peça “Morte na Catedral”
O palco do
Instituto de Educação de Minas Gerais foi um lugar privilegiado que abrigou
personagens ilustres como, por exemplo, o grande poeta Olavo Bilac (em 26 de
agosto de 1916) e o presidente da republica Juscelino Kubistchek (paraninfo da
turma de normalistas do ano do cinquentenário da fundação da Escola Normal).
Outro momento marcante foi a famosa peça “Crime na Catedral” (Murder in the catedral), de T. S. Eliot.
Considerada uma das mais ousadas peças do teatro moderno, exigiu uma produção
sofisticada e muitos recurso. Encenada pelo Teatro Universitário, em 1958, como
parte das comemorações do 60° aniversário da cidade. Teve um grande impacto na
cidade pelo extremo requinte da representação. A direção ficou a cargo de
Giustino Marzano e Carlos Kroeber. O primeiro encenou diversas peças na Europa,
fez televisão em Londres e cinema na Itália. O segundo também protagonizou essa
peça, no papel do bispo Thomas Becket. Os cenários e figurinos são de Alfredo
Mucci. A música original da peça foi composta pelo maestro Sérgio Magnani e
executada pela Orquestra Sinfônica de Minas Gerais e a da Polícia Militar. O
elenco de sessenta atores foi formado por Carlos Kroeber, Amélia Carmen
Machado, Silvio Castanheira, Maria Lúcia Coutinho, Mariângela Vargas, Marilene
Rodrigues de Melo, Neuza Rocha, entre outros.
Com uma
montagem cara (algo em torno de meio milhão de cruzeiros), a peça foi um grande
sucesso de público e de crítica. Foi apresentada em sessões diárias durante
três semanas. No dia da première de gala,
compareceram no auditório do IEMG figuras importantes da política e sociedade
belorizontina. Tais como, o ministro Clóvis Salgado, o professor Pimenta da
Veiga (chefe da Casa Civil do governo Bias Fortes), o professor Lincoln Prates
(reitor da Universidade de Minas Gerais), além de figuras de grande projeção
nos meios artísticos da capital.
Foi escrita em 1935 a pedido da ordem da Cantuária para
exaltar a figura de Thomas Becket, um mártir, que dois anos depois de sua morte
foi beatificado. A peça conta a história do arcebispo da Cantuária. Começa com o retorno de Thomas depois de sete anos
exilado na França, que volta para a Grã-Bretanha mesmo sabendo que será
assassinado, pois está em conflito com o Rei da Inglaterra. Como se fosse uma tragédia grega, a história é
pontuada pela presença de sacerdotes e acompanhada
por um coro de mulheres que temem por sua segurança. Becket sofre várias tentações,
personificadas por quatro atores, representando: prazeres mundanos; poder
temporal contra o rei; poder temporal contra os inimigos do rei (os barões), e
poder espiritual e glória. Eloquentemente, Thomas enfrenta cada um deles, por
sua vez, quase sucumbindo, no entanto, com o último deles, o que ele
considerava a maior traição.
A direção de Marzano foi fiel ao texto. Construiu um belo
ensaio sobre o martírio humano ao lidar
com a tensão entre a modernidade e o classicismo. O personagem Beckett é um exemplo de força profética e espírito
oblativo. Uma voz que não se cala perante um rei que queria colocar-se acima da
Lei.
A encenação
dessa peça no auditório do Instituto de Educação de Minas Gerais foi importante
não apenas para a história da nossa escola, foi mais importante para a cidade
de Belo Horizonte. Pois, nesse espaço privilegiado e com essa peça moderna e
instigante, nasce a semente do que será mais tarde o teatro mineiro de autor e
de vanguarda. Ou seja, um teatro que não se prende ao puro entretenimento, mas
busca a reflexão crítica da nossa sociedade. Para fundamentar tais afirmações,
basta citar alguns trechos publicados na imprensa da época. Assim, para o
crítico teatral do jornal “Folha de Minas”, J. F. Brandão, “Crime na catedral”
foi um grande espetáculo que “não pode ser mais considerado pelos padrões
comuns do teatro amador, mas exige que seja visto como obra definitiva,
experiência concretizada de um ideal há muito acalentado. [...] primeiro marco
de um teatro sério em Minas”. No jornal “O Binomio”, Afonso Estevão Torres
afirmou que, depois dessa peça “Belo Horizonte já não é mais uma cidade sem
teatro.” O professor Aires Mata Machado, no jornal “O Diário” disse que “Não se
trata de ser ou não ser de teatro. Impõe-se a manifestação de um entusiasmo
incontido. São palmas escritas.”
[1] O teatro municipal (mais
tarde cine Metrópole)
foi inaugurado em 21
de outubro de 1900. Foi construído por José Verdussem. Neste dia foi
apresentado a peça "Magda", com a companhia de Nina Sanzi, uma
artista mineira que fazia sucesso na Europa
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